Quando ouvimos pela primeira vez falar de um surto de um novo coronavírus na China, estávamos longe de imaginar que iríamos viver o que estamos atualmente a viver. Para além das implicações na vida pessoal e profissional da população, também a Cultura e a Educação tiveram que se adaptar, rapidamente, sem qualquer tipo de preparação.
No caso da adaptação do sistema de ensino português à pandemia provocada pelo Covid-19, é fácil apontar vários aspetos que não correram bem. Aliás, uma passagem de um ensino totalmente presencial para um ensino à distância carece de meios, planeamento e fundamentos científicos aliados a uma avaliação de experiências já realizadas. No entanto, não houve tempo para isso. Ou pelo menos, nada fazia crer que tal viesse a ser uma necessidade. Mas o vírus chegou a Portugal, a uma população e governo pouco preparados para lidar com ele. Muito se fez, o melhor que se pôde, quer a nível de ensino, de saúde, de consciencialização da população para ficar em casa e travar a propagação do vírus maldito. Muito foi exigido aos profissionais de saúde, aos professores, aos empreendedores, aos pais, às crianças… a todos! Entrámos todos numa luta, em conjunto, contra um inimigo invisível, que ainda não acabou.
Em relação ao ensino, não podemos olhar para trás e apontar o dedo ao que não correu bem. Há que valorizar o que governo, professores, pais e alunos fizeram. Agora é tempo de analisar o caminho que o ensino deve tomar. Esta pandemia mostrou-nos como devemos estar preparados para um ensino mais avançado, mais tecnológico, sem descurar a importância das aulas presenciais. Precisamos de um sistema de ensino preparado para não parar durante uma pandemia (parece que vamos ter que conviver com esta durante algum bom tempo, e é possível que surjam mais no futuro).
É nesse sentido que o Ministério de Educação está a trabalhar, num sistema de ensino presencial que seja facilmente adaptável para um regime à distância ou misto. No entanto, há que sermos realistas. Tal acontece no meio de uma pandemia, fruto de uma necessidade que exige que seja aplicado o mais rapidamente possível. Não há tempo para se criar um sistema de ensino baseado em fundamentos científicos que garantam o seu sucesso. De forma a haver igualdade num sistema de ensino, há questões básicas que não estão garantidas, como o acesso por todos a um computador e à internet. Está a criar-se um novo sistema de ensino que exige um grande investimento num momento em que o país entra numa grave crise económica devido à pandemia. Não estamos preparados! Longe disso…
Ainda o ano letivo 2020/2021 não começou e já há razões de queixa:
› Um calendário escolar alargado que tem tudo para criar um esgotamento a alunos e professores (aliado a um fim de ano letivo completamente atípico e por si já bastante exigente)
› Uma imposição de se criar distanciamento social nas salas de aula sem redução de alunos por turma.
› A dificuldade dos encarregados de educação nas matrículas graças a uma plataforma cheia de erros e nada preparada para um número elevado de acessos, que levou à decisão de renovação automática das matrículas para a maioria dos alunos (pergunto-me como países com o dobro, triplo, ou décuplo da população portuguesa, cujo número de acessos em simultâneo ultrapassa em muito o dos portugueses, conseguem ter plataformas digitais sem estes constrangimentos)
› O bate-pé do Governo em relação aos manuais escolares que pretendia a sua devolução, cuja pretensão foi negada pelo Parlamento. Depois de os pais começarem a devolver os manuais, foi decretada a suspensão da sua devolução, criando assim mais constrangimentos aos agrupamentos de escolas que têm de agendar novas datas agora para devolver os manuais aos alunos… (e veremos que implicação terá na entrega dos vouchers para a aquisição dos manuais para o próximo ano letivo).
Para um sistema de ensino em transformação para um modo cada vez mais digital, os problemas detetados na plataforma criada para as matrículas demonstram-nos claramente que não estamos preparados.
Assim, o que podemos esperar do próximo ano letivo?
Para já as previsões não são animadoras. Existe ainda muita incerteza e falta de orientações concretas por parte do Ministério da Educação. Está a criar-se um sistema de ensino “em cima do joelho”, sem grandes fundamentos científicos e que poderá agravar as desigualdades entre os que têm maior facilidade de acesso às tecnologias e os que nem sequer têm um computador, entre os que têm recurso a apoios a explicadores e os que estão apenas por si, entre os que têm pais que conseguem apoiar e estar mais presentes e os que têm os pais com menor disponibilidade para apoiar o estudo dos seus filhos (sim, as desigualdades já existem, mas um sistema de ensino com componente de ensino à distância mal preparado vai com certeza agravá-las).
Vamos todos contribuir
Apesar destas previsões nada animadoras, analiso toda esta situação com alguma normalidade. Convém entender que o ensino em Portugal baseia-se em métodos tradicionais que têm resistido às alterações profundas da sociedade, alterações essas que têm acontecido a um ritmo elevado. Têm surgido cada vez mais projetos inovadores, e esta nova alteração no nosso quotidiano provocada pela pandemia irá com certeza fazer surgir ainda mais projetos e ideologias novas sobre o ensino. É um caminho ainda longo até se chegar a um sistema de ensino mais justo, mais eficaz, mais atual e ao encontro das crianças e dos jovens do nosso tempo, mas passo a passo para lá caminharemos.
É em conjunto que vamos conseguir fazê-lo. A Educação e o Ensino não se devem limitar pelo espaço físico da escola. Não devemos deixar a responsabilidade toda nos governos e nas escolas. Pais e alunos podem criar projetos de aprendizagem, professores e educadores podem também eles criar e pensar em novas metodologias.
Sempre defendi metodologias menos presas às quatro paredes de uma sala de aula. Está na hora de desenvolvê-las! Precisamos de quebrar algumas normas que vemos no ensino (relação professor/aluno, sobrevalorização da sala de aula como espaço de aprendizagem, …), e para isso é necessário algum tempo. É preciso criar, colocar em prática, avaliar, melhorar, colocar em prática esses melhoramentos, voltar a avaliar, e assim sucessivamente até conseguirmos criar um sistema educativo cada vez mais eficaz e capaz de dar resposta às adversidades e necessidades do hoje e do amanhã.
Por tudo isto, espera-se um, dois, ou mais provavelmente muitos anos letivos difíceis. Advinham-se muitas leis novas, muitas exigências para a aplicação das mudanças que vamos assistir no ensino, em que muitas vão resultar em fracasso… Tudo normal quando se encontra num caminho à procura do melhor de si. Nós seremos os agentes dessas mudanças, recebendo de igual forma os seus fracassos e sucessos.
“Todo amanhã se cria num ontem, através de um hoje. Temos de saber o que fomos, para saber o que seremos” – Paulo Freire
Luis Carrilho
Vai ficar tudo bem? Não! Temos todos de fazer o nosso papel para que tudo melhore!
Está na hora de deixar de apontar o dedo, e cada um de nós agir para que a situação pandémica melhore
No ensino à distância estarão os professores a avaliar alunos, pais ou explicadores?
Temos de repensar o ensino, a forma tradicional de um professor por disciplina e que não colabora com os outros professores, novas formas de ensinar que não estejam dependentes de uma sala de aula, e novas formas de avaliar
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